quarta-feira, 27 de abril de 2011

ALÉM DOS DIMINUTIVOS

MULHERES BOAZINHAS

      Qual o elogio que uma mulher adora receber?


      Bom, se você está com tempo, pode-se listar aqui uns setecentos: mulher adora que verbalizem seus atributos, sejam eles físicos ou morais. Diga que ela é uma mulher inteligente, e ela irá com a sua cara.

     Diga que ela tem um ótimo caráter e um corpo que é uma provocação, e ela decorará o seu número.

     Fale do seu olhar, da sua pele, do seu sorriso, da sua presença de espírito, da sua aura de mistério, de como ela tem classe: ela achará você muito observador e lhe dará uma cópia da chave de casa.Mas não pense que o jogo está ganho: manter o cargo vai depender da sua  perspicácia para encontrar novas qualidades nessa mulher poderosa, absoluta.

    Diga que ela cozinha melhor que a sua mãe, que ela tem uma voz que faz você pensar obscenidades,

que ela é um avião no mundo dos negócios.

     Fale sobre sua competência, seu senso de oportunidade, seu bom gosto musical.

     Agora quer ver o mundo cair? Diga que ela é muito boazinha.

     Descreva aí uma mulher boazinha. Voz fina, roupas pastel, calçados rente ao chão. Aceita encomendas de doces, contribui para a igreja, cuida dos sobrinhos nos finais de semana.

    Disponível, serena, previsível, nunca foi vista negando um favor. Nunca teve um chilique.Nunca colocou  os pés num show de rock.

   É queridinha.

   Pequeninha.

  Educadinha.

   Enfim, uma mulher boazinha.

   Fomos boazinhas por séculos. Engolíamos tudo e fingíamos não ver nada, ceguinhas. Vivíamos no nosso mundinho, rodeadas de panelinhas e nenezinhos. A vida feminina era esse frege: bordados, paredes brancas,
crucifixo em cima da cama, tudo certinho.

   Passamos um tempão assim, comportadinhas, enquanto íamos alimentando um desejo incontrolável de virar a mesa.

   Quietinhas, mas inquietas.

      Até que chegou o dia em que deixamos de ser as coitadinhas. Ninguém mais fala em namoradinhas do Brasil: somos atrizes,estrelas, profissionais.

   Adolescentes não são mais brotinhos: são garotas da geração teen. Ser chamada de patricinha é ofensa mortal.

   Pitchulinha é coisa de retardada.

   Quem gosta de diminutivos, definha.

   Ser boazinha não tem nada a ver com ser generosa. Ser boa é bom, ser boazinha é péssimo.

   As boazinhas não têm defeitos.Não têm atitude.Conformam-se com a coadjuvância. PH neutro.

  Ser chamada de boazinha, mesmo com a melhor das intenções,é o pior dos desaforos.

  Mulheres bacanas, complicadas, batalhadoras, persistentes, ciumentas,apressadas, é isso que somos hoje.

Merecemos adjetivos velozes, produtivos, enigmáticos.

As “inhas” não moram mais aqui.

Foram para o espaço, sozinhas.
 
 
MARTHA MEDEIROS

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