quarta-feira, 27 de abril de 2011

Amor aos pedaços



Diálogo final

-É tudo que tem a me dizer? - Perguntou ele.


- É! - ela respondeu.

- Você disse tão pouco.

- Disse o que tinha para dizer.

- Sempre se pode dizer mais alguma coisa.

- Que coisa?

- Sei lá. Alguma coisa.

- Você queria que eu repetisse?

- Não. Queria outra coisa.

- Que coisa é outra coisa?

- Não sei. Você devia saber.

- Por que eu deveria saber o que você não sabe?

- Qualquer pessoa sabe mais alguma coisa que  o outro não sabe.

- Eu só sei o que sei.

- Então não vai mesmo me dizer mais nada?

- Mais nada.

- Se você quisesse...

- Quisesse o quê?

- Dizer o que não tem pra me dizer. Dizer o que não sabe, o que eu queria ouvir de você.Em amor é o que há de mais importante: o que a gente não sabe.

- Mas tudo acabou entre nós.

- Pois isso é o mais importante de tudo: o que acabou. Você não me diz mais nada

sobre o que acabou? Seria uma forma de continuarmos.
 
(Carlos Drummond de Andrade)
 
 
 
 
Os versos que te fiz




Deixa dizer-te os lindos versos raros

Que a minha boca tem para te dizer!

São talhados em mármore de Paros

Cinzelados por mim para te oferecer



Têm dolência de veludos caros,

São como sedas pálidas a arder...

Deixa dizer-te os lindos versos raros

Que foram feitos pra te endoidecer!



Mas,meu Amor,eu não tos digo ainda.

Que a boca da mulher é sempre linda

Se dentro guarda um verso que não diz



Amo-te tanto!E nunca te beijei...

E nesse beijo,Amor,que eu não dei

Guardo os versos mais lindos que te fiz!



(Florbela Espanca)





Ternura



Eu te peço perdão por te amar de repente

Embora o meu amor

seja uma velha canção nos teus ouvidos

Das horas que passei à sombra dos teus gestos

Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos

Das noites que vivi acalentando

Pela graça indizível

dos teus passos eternamente fugindo

Trago a doçura

dos que aceitam melancolicamente.

E posso te dizer

que o grande afeto que te deixo

Não traz o exaspero das lágrimas

nem a fascinação das promessas

Nem as misteriosas palavras

dos véus da alma...

É um sossego, uma unção,

um transbordamento de carícias

E só te pede que te repouses quieta,

muito quieta

E deixes que as mãos cálidas da noite

encontrem sem fatalidade

o olhar estático da aurora.



(Vinícius de Moraes)
   “Eu te amei muito. Nunca disse, como você também não disse, mas acho que você soube. Pena que as grandes e as cucas confusas não saibam amar. Pena também que a gente se envergonhe de dizer, a gente não devia ter vergonha do que é bonito. Penso sempre que um dia a gente vai se encontrar de novo, e que então tudo vai ser mais claro, que não vai mais haver medo nem coisas falsas. Há uma porção de coisas minhas que você não sabe, e que precisaria saber para compreender todas as vezes que fugi de você e voltei e tornei a fugir. São coisas difíceis de serem contadas, mais difíceis talvez de serem compreendidas — se um dia a gente se encontrar de novo, em amor, eu direi delas, caso contrário não será preciso. Essas coisas não pedem resposta nem ressonância alguma em você: eu só queria que você soubesse do muito amor e ternura que eu tinha — e tenho — pra você. Acho que é bom a gente saber que existe desse jeito em alguém, como você existe em mim.”
 
(Caio F Abreu)

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