domingo, 26 de dezembro de 2010

CHEIRO DE ALFAZEMA


Último domingo do ano, dia para refletir, repensar e rememorar. Ana dormia tranquilamente após almoçar com seus pais na casa que passara toda a infância. O sentimento de nostalgia invadia seu coração, época natalina, tempo propício para celebrar, mas também para  renovar os laços de amor e amizade. Fazia meses que ela e Ricardo não conversavam, embora ela nutrisse um carinho infindável por ele, que representava sensibilidade e mistério. Enfim, ela jamais imaginara que, motivado pelo espírito natalino, o amigo a procuraria naquele dia.
Embalada pelo clima ameno ela descansava após uma maratona intensa de troca de afetos, presentes e votos de felicidade. O telefone tocara algumas vezes e ela, cansada, sonolenta, imaginara que alguém havia combinado com o destino de atrapalhar seu sono e envolvida pelo torpor resolveu não atender, pois o número já estava registrado e tão logo acordasse de seus son(h) o retornaria a ligação.
Ao acordar, descobriu que o autor daquele telefonema, a princípio inoportuno, era Ricardo seu companheiro querido dos tempos de escola. O número registrado carregava consigo todas as lembranças de outrora, os implícitos, os silêncios, as trocas de olhares, as conversas de corredor e, sobretudo, trazia à mente o frescor da alfazema.
Avidamente Ana retornou a ligação e imaginando que o amigo atenderia prontamente, decepcionou-se. Pensou que fosse engano, que talvez ele quisesse telefonar para outra que também se chamava Ana, afinal de contas era um nome tão comum. Voltou aos afazeres diários que a maternidade exigia e horas depois, ao perceber que o amigo retornara a ligação, finalmente venceu o medo e telefonou para ele. Nesse momento foi envolvida pelo calor da alfazema, conversaram durante alguns minutos e era como se nunca houvessem rompido a relação de amizade.

Ambos conversaram sobre amenidades, sobre a convivência de outrora e felicitaram-se pelo ano que estava prestes a iniciar, falaram sobre a importância de se camuflar para sobreviver em sociedade e Ana descobriu que conhecia quase nada do amigo, uma vez que ele se protegera durante os anos em que estiveram juntos.  
Ricardo, prudentemente, desligara o telefone desejando que a amiga fosse muito feliz e realizasse todos os desejos que guardasse no íntimo, mal sabia que o maior anseio de Ana era que ele se mostrasse por inteiro e permitisse que o cheiro de alfazema afastasse do peito tudo aquilo que ficou por vir.

“Não cantarei o mar: que ele se vingue de meu silêncio nesta concha”.




Nome científico: Lavandula angustifolia – (outras espécies: Lavandula spica, Lavandula vera, Lavandula officinalis, Lavandula angustifolia.)
Nomes populares: Alfazema, Lavanda, Lavandula, Nardo.
A lavanda é sedativa e equilibradora, digestiva, anti-reumática e antiinflamatória, anti-séptica, cicatrizante, relaxante, redutora da fadiga, sedativa, balsâmica.

2 comentários:

  1. Que bela crônica pós-natal, amiga. Sentir o cheiro da alfazema já não será mais a mesma coisa pra mim...

    Estou gestando seu presente de natal. Nesta semana ainda apareço por aí.

    Bj grande de saudade!

    ResponderExcluir